Poesias

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Sou a Pedra redonda
Zoiúda
Que vigia sem parar os arredores.


Sou o Pico do Itambé
Encoberto de nuvens
Que se esgarçam ao primeiro sol.


Sou a Serra do Cipó
De sinuosas curvas
Perdidas entre nós
Cegos e
Vendados mistérios


Sou a Lapa da Boa Vista
Que soluça lágrima seca
Em tardes mornas de sol.


Sou o condado virgem
No recato de seus medos.


Sou o Quatro vinténs
Que corre para o Lucas
Em curso lento e choroso.


Sou o Morro Centenário
Que deita a cabeça no colo de Deus
Pedindo um cafuné
Na rara cabeleira.


Sou os veeiros depauperados
De outras riquezas encobertas.


Sou a Fonte do Vigário
Gotejando esquecida
Pelos cantos do Chaveco


Sou o coreto em destroços
Sufocando a sinfonia da vida.


Sou o palco do mundo
À espera da melhor peça.


Sou as ruas de Baixo e de Cima
E os becos sem saída.


Sou a Ladeira do Pelourinho
Batizada pelo grito escravo
Que retumba na senzala do tempo.


Sou o Paredão da Matriz
Na contenção da encosta
Da fé primeira.


Sou a palmeira gigante e altiva
Que ameaça o céu
Sem fazer requebros
Quase inerte sobre raízes profundas.


Sou o casario de linhagem nobre
Contrariando a lei da gravidade.


Sou o cargueirinho alienado
Que desce a rua
Atravessa a festa
O discurso
E estruma no chão
Em pose para a posteridade.


Sou a Capela de São Miguel
Que badala a morte
Ao dar sinal de vida.


Sou o prédio da Cadeia
E o pensamento livre
Que escapole inteiro
Ou em fragmentos
Pelas grades
E vai sem peia.


Sou Igreja Santa Rita
Em esplêndida janela
Espiando da colina
A cidade baixa
Ressuscitar das brumas.


Sou a gente
Que pede licença
Para pisar este chão
Para respirar estes ares
Para poetar sob este céu.


De onde vim
Só pra ser uma flor exótica
Entre rochas e colinas
Da minha terra.

Alto
Chamas
Cenas
De
Luz
Arauto
Do alto
Acenas
Chamas
Rasgando essas trevas
Espalhando o sopro
Por tua criação

Emergente
Emerge
Entre
De mim
Emergente
Menos ente
Mais gente
Emerge

Fulgente
‘’ Full’’...
Da Mortalha de um tempo
Do assombro do vazio
Nova face
Nova mulher
Na aventura do recomeço
Mias gente
Só.

De
Vagar
Cansado
Passo a passo
Lenta
Mente...
Com
Passadas
Toadas
Do Caminhar...

Eu
Ca
Li
Pito
Cheira
Bom
Quase
Bálsamo
De mim.

Sensual
Sem
Idade
Sensualidade
Não
Caduca.

Serro
Com Frio
De alma acalorada
Com Sol
E de sombra remansosa
Serro
Com chuva
E de sombra remansosa
Serro
Com chuva
E de ribeiros secos
Serro
Sem erro
Concerto de Minas
Velho Serro
Sem idade
Que teus serros
Vigiarão por nós
Serro
Com teus morros calvos
Sem tua farta cabeleira
De fala eloqüente
E memória silenciosa
Sem o tumulto do progresso

AUTONOMINA MUNICIPAL NO ESTADO BRASILEIRO

Maria Coeli Simões Pires

Maria Coeli Simões Pires é Mestre em Di- reito Administrativo pela Faculdade de Direi- to da UFMG, doutoranda e profesora junto à mesma Faculdade.

Sumário

  1. Considerações preliminares.
  2. Origem do Município brasileiro.
  3. Evolução do regi- me municipal no Brasil e conformação da au- tonomia.
  4. Neo-municipalismo na Constitui- ção de 1988.
    1. Competências constitucionais do município.
  5. Descentralização e poder lo- cal sob uma visão comparativa.
    1. Descentra- lização na Alemanha.
    2. Outras experiências de governos locais.
  6. Conclusão – uma visão crítica da autonomia no Brasil.

1. Considerações preliminares

O Município, tradicional objeto de inves- tigações no campo do Direito, da Adminis- tração Pública e do Urbanismo, hoje, sensi- velmente impactado, por um lado, pelo mar- cante fenômeno de complexificação social a impor a densificação de demandas e rela- ções em âmbito local, e, por outro, pela ten- dência globalizante da economia e da cul- tura, a par de continuar como desafio da- quelas ciências, suscita a canalização de esforços de estudiosos de outras áreas do conhecimento, notadamente da Sociologia, da Psicologia, da Economia, da Ciência Po- lítica e da História, para quem já se coloca como categoria funcional estratégica de ga- rantia de referência e de identidade dos ci- dadãos. Assim é que se afirma o Município como contraponto da tendência universali- zante, como espaço de expressão do homem- sujeito, e, entao, de significação do dado ou estatística e, ainda, como o locus de apropriação dos benefícios da civilização e de revelação de seus efeitos perversos.

Nesse contexto, o próprio direito há de desenvolver ânimo criador de nova reflexão acerca dos conteúdos desse núcleo de estu- dos, na busca de releitura e ressemantiza- ção de seus elementos, a partir de conside- rações outras, que, classicamente, refugiriam ao plano comum de análise.

A autonomia municipal, tema estrutu- rante das construções jurídicas nesse cam- po, há, pois, de ser retomada tendo em vista a nova contextualização e a contribuição multidisciplinar que se adensa no estudo de estratégias de gestão contemporânea e de compreensão da trama urbana e dos di- versos atores que a tecem.

Nesse sentido, as questões relacionadas com as tendências internas quanto à orga- nização local e com as perspectivas do di- reito comunitário assumem um papel fun- damental na ressemantização do conceito da autonomia municipal no Brasil, o que está a demandar estudo específico.

Com o propósito de preparar as bases para a reflexão, buscar-se-á, neste passo, o recuo na tentativa de rastrear as origens da instituição municipal, em breve escorço his- tórico, sem uma científica sistematização dos diversos estamentos de razões que a eri- giram no tempo; as construções teóricas só permearão a abordagem como suporte para reavaliação, tendo em vista o prisma da rea- lidade brasileira, dos pontos essenciais e das teses fundamentais que o tema suscita, pacificadas ou não. O presente trabalho não abre espaço para que se possa passar a lim- po a teoria dos Municípios, seja porque a pertinaz caminhada da Doutrina brasileira nessa seara já muito avançou, seja porque a realidade da Federação brasileira está a in- vocar uma reflexão sobre o tema sob pers- pectiva mais conjuntural.

Tomar-se-á, entao, o aporte já feito em substanciosos trabalhos sobre a matéria, muitos deles anteriores à Constituição de 1988, e outros editados na vigência da nova ordem, sendo certo que, sob a égide do Esta-

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do Democrático de Direito, intensificaram- se as contribuições, ampliando-se consi- deravelmente a plêiade de estudiosos de assuntos atinentes à municipalidade bra- sileira.

2. Origem do Município brasileiro

Diferentemente das cidades européias surgidas a partir do século XII como fruto de evolução natural dos grupos sociais, as brasileiras foram impulsionadas pelos artifícios e interesses colonialistas da Me- trópole1.

Segundo Castro2, nossa instituição mu- nicipal, tendo sua origem nas comunas por- tuguesas, inaugurou-se no Brasil com a cria- ção, por Martim Afonso, em 1532, sob a vi- gência das Ordenações Manuelinas de 1521, da Vila São Vicente, atual São Paulo, segui- da aquela por Olinda, Santos, Salvador, Santo André de Borda do Campo e Rio de Janeiro. A Vila, por sua vez, marcou o início da República Municipal Brasileira, consti- tuindo-se, historicamente, no primeiro gover- no local autônomo das Américas, conforme re- gistra Godoy3.

A política de colonização portuguesa, partindo da fundação de vilas e atendendo aos interesses da Metrópole, tomara, ini- cialmente, a descentralização como estraté- gia para a ocupação territorial, um modo mais seguro de garantir a dependência da Colônia. A lógica de dispersão do poder em diversos pólos justificou a instituição das Capitanias Hereditárias, concedidas aos do- natários sob regime de sujeição à Metrópole e com autonomia interna, cabendo àqueles, entre outros poderes, o de criar Vilas, con- forme anota Rocha4.

Essas Capitanias, em sua feição original, perpétuas, inalienáveis e hereditárias, orga- nizaram-se sob os signos da autonomia e indivisibilidade, submetendo-se, contudo, às imposições da Coroa.

A organização municipal lusitana foi, entao, transplantada para as primeiras vi- las e cidades do Brasil com suas múltiplas figuras: um alcaide, juízes ordinários, verea- dores, almotacés, juiz de fora, procurador e homens bons. A estrutura revelou logo a imposição da Metrópole e um certo despres- tígio da Comuna, alçada ao controle cercea- dor daquela, especialmente, pela integração dos representantes da Coroa nos Conselhos, os juízes de fora5.

O principal papel de governo local fora reservado à Câmara Municipal ou Câmara de Vereança, composta de vereadores esco- lhidos entre os grandes proprietários, os chamados “homens bons”, e juízes, ordiná- rios ou de fora, estes enviados de Portugal para zelar pelos interesses da Coroa. Entre as atribuições da Câmara, a administração do patrimônio público, a autorização para construção de obras públicas, o policia- mento, a nomeação de funcionários e o esta- belecimento de impostos.

As vilas e as cidades evoluíram. O siste- ma de Capitanias, contudo, não apresentou os resultados esperados, verificando-se o de- senvolvimento de algumas delas apenas.

Surgiram, entao, propostas unificadoras da Colônia, estruturadas pela reação das Capitanias, ou a partir do espírito centralis- ta da Coroa, e que se revelaram em contradi- tórias medidas: a instalação do Governo-Ge- ral na Bahia, que, entanto, logo dividiu po- der com o estabelecido no Rio de Janeiro (1572); a transferência da Corte Portuguesa para a Colônia, com o propósito de domina- ção das capitanias; a elevação daquela a Vice-Reino, a Reino Unido de Portugal e Algarve; o próprio evento da Independên- cia, que, conquanto tivesse precedentes re- lacionados com a alternativa de índole fe- derativa, assentou solução unitarista, sob o argumento de adequação aos propósitos de consolidação da emancipação do Estado Brasileiro6.

Apesar da lógica centralista da Coroa no tocante à administração, persistente na sub- jugação da Colônia e na resistência das Ca- pitanias às Comunas, a instituição munici- pal ganhou incontestável vigor ainda no Brasil Colônia, para o que contribuíram,

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entre outros fatores: a distância da Metró- pole; a vastidão territorial da Colônia; o afas- tamento entre a cidade e a sede dos latifún- dios, o que projetava a necessidade de que cada cidade logo se constituísse em centro de poder auto-suficiente; a ênfase dada pela colonização portuguesa à instalação de núcleos urbanos como suporte às aspirações de desenvolvimento da burguesia mercan- til, seja como ponto de convergência da pro- dução rural, seja como estratégia para al- cance do mercado europeu; as determina- ções contidas nas cartas de doação aos do- natários e nos regimentos dos Governado- res-Gerais quanto às atividades econômicas e quanto à fundação dos centros político- administrativos; o apoio da Igreja; o poder político da vereança e a iniciativa própria das câmaras que se arrogavam relevantes atribuições em assuntos das Capitanias e de interesse local; o poder econômico dos proprietários rurais; o sentimento nativista de cada povo e a reação das Câmaras con- tra os governadores das Capitanias Heredi- tárias. Registros desse tempo dão conta da existência de senadores das Câmaras Mu- nicipais do Brasil e do clima de resistência das Casas Legislativas locais aos Governa- dores, como resposta às sucessivas tentati- vas da Coroa de submeter as localidades à superioridade das Capitanias. Nesse clima de resistência, as Câmaras, gozando de au- tonomia, chegaram a questionar o domínio da Coroa, o que levou a sucessivas medidas de restrição do poder local por parte da Metrópole7.

A despeito das tentativas de unificação no Brasil Colônia e da unidade do Brasil Império, a estrutura descentralizada do Es- tado brasileiro, adotada, na Carta de 1824, por imposição política, fora assimilada como solução natural. Em efeito, a centrali- zação caiu logo em declínio, antes que se aglutinassem as Províncias em torno do mo- narca, motivando a partida de D. Pedro I para Portugal em 1831. Após esse episódio, instalou-se a regência em clima francamen-

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te aberto à descentralização, principalmen- te pela posição independente das Provín- cias e pelas injunções regionais com o apelo de participação. Desse período, anotam-se, ainda, providências importantes de inspi- ração descentralizadora: o Ato Adicional – Lei no 16, de 12 de agosto de 1834, e o Códi- go de Processo. O referido Ato, embora não tendo acolhido soluções aventadas no pro- jeto que lhe servira de antecedente, como a de Monarquia Federativa, entre outras alter- nativas mais ousadas, adotou a substitui- ção dos Conselhos Gerais das Províncias por Assembléias Provinciais com poderes significativamente mais amplos que os da- queles. Não se registrara, contudo, lineari- dade nesse processo, eis que não infenso às pressões e críticas, constatando-se alternân- cia centralização – descentralização até que se firmaram as bases do federalismo8.

3. Evolução do regime municipal no Bra- sil e conformação da autonomia

Deitando raízes no contexto sócio-polí- tico e econômico do período colonial, a ins- tituição municipal aí se conformou e evo- luiu, sofrendo, também, adaptações na fase seguinte, na qual se elevou a Colônia à cate- goria de Vice-Reino (1763). Com efeito, es- truturou-se o regime municipal, principal- mente, a partir de 1549, no Governo-Geral, quando as Câmaras Municipais, revestin- do-se de grande prestígio político, tiveram nas pessoas de seus senadores os respon- sáveis pela administração do Município, pela arrecadação dos impostos e pela admi- nistração da justiça, detendo poder de con- trole sobre Governadores e forte atuação no processo emancipacionista brasileiro. Pre- sentes naquelas representações a índole li- bertadora e a identificação com as aspira- ções de nacionalidade.

Referindo-se ao regime municipal sob os auspícios da Coroa Portuguesa, Brasileiro9 mostra os interesses que sustentaram a or- ganização local de entao:

“No período colonial, que se esten- de até 1822, as cidades funcionaram, principalmente, para promover os in-

teresses dos colonizadores portugue- ses voltados para a exportação ou para a ocupação do interior. (…) A munici- palidade brasileira conservou-se num estágio primitivo e foi bastante inefi- ciente como unidade de governo”.

No Brasil Império, a instituição munici- pal ganhou foro constitucional. A Carta de 1824, num aceno de fortalecimento da ins- tância local, destinou tratamento especial às Câmaras Municipais, em capítulo apar- tado, estabelecendo, entre outras prescri- ções, que, em todas as cidades e Vilas entao existentes e nas mais que para o futuro se criassem, haveria Câmaras eletivas, às quais competiria o governo econômico e munici- pal (art. 167).

A Constituição reservara à lei a defini- ção do número de vereadores às câmaras e a explicitação das funções municipais e dos critérios de formação das Posturas Polici- ais, a forma de aplicação das rendas e todas as particularidades e atribuições do Muni- cípio.

A Lei 28, de 1/10/1828, editada como documento básico da organização munici- pal no Brasil, em linha centralizadora, e em contradição com as idéias nacionalistas, es- tabeleceu subordinação administrativa e po- lítica das Câmaras aos presidentes das Pro- víncias, reduzindo o órgão legislativo mu- nicipal a mera corporação administrativa dos Conselhos Provinciais, sem atuação na jurisdição contenciosa. Configurou-se, aí, absoluta fragilidade da autonomia, já que ficou, entao, reservado um papel secundá- rio e subalterno à Câmara, por sua vez, am- plamente submetida à tutela permanente do poder central mediante autorizações para obras, aprovação de nomeações dos empre- gados e outras manifestações limitadoras, e, sobremaneira, vitimada pela perda de muitas franquias. Nesse quadro, não pas- saram os Municípios de meras circunscri- ções administrativas.

Meirelles10 afirma, contudo, que as mu- nicipalidades, mesmo sob o centralismo

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Revista de Informação Legislativa

imperial, foram mais autônomas que no re- gime de 1937, porque os

“interesses locais eram debatidos na Câmara de Vereadores e levados ao conhecimento dos Governadores (Lei 1828) ou das Assembléias Legislati- vas das Províncias (Ato Adicional de 1834)”.

Em 1834, o Ato Adicional abriu perspec- tiva no sentido de que as Províncias recupe- rassem o prestígio do poder municipal, como reação à linha centralizadora da Lei 28. Não houve, entretanto, qualquer fortale- cimento no plano da reforma constitucio- nal ou das normas subseqüentes, tendo pre- valecido, em todo o Império, o desprestígio do governo municipal e o clima francamen- te desfavorável ao ideário de autonomia das municipalidades.

Consoante apostila Tavares Bastos11, em estudo clássico sobre a matéria, o que se buscou, posteriormente, foi a descentraliza- ção provincial, não se tendo cogitado da autonomia municipal.

A Constituição de 1891, consagrando o Federalismo e revigorando a instituição lo- cal, inaugurou, no art. 68, a expressão auto- nomia municipal e o próprio termo Municí- pio, vinculando o conteúdo daquela ao cri- tério do peculiar interesse. Fê-lo, todavia, em frágil construção, já que sua extensão deve- ria ser traçada pelo próprio Estado. Tal pe- culiaridade, aliada à escassez de recursos destinados aos municípios e às contingên- cias de nomeação de prefeitos para a maio- ria dos municípios, reservou àquele modelo de autonomia um caráter meramente nomi- nal.

O municipalismo — segundo as críticas não-liberais, uma idéia exótica, e, sobretu- do, americana — só emergiu, verdadeira- mente, no século XX, na esteira do Movi- mento Pluralista. A ideologia municipalis- ta aí se estruturou para desembocar na cam- panha do Movimento Municipalista, que gerou, a um só tempo, instituições como o IBAM e a Associação Brasileira dos Muni- cípios, conforme assevera Melo12.

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Até a década de 30, as circunstâncias sócio-político-econômicas do Brasil, tais como a prevalência da economia de expor- tação do café, da oligarquia rural e do coro- nelismo, distanciaram, sobremaneira, as perspectivas de um Brasil urbano, a despei- to da ocorrência de alguns processos de ur- banização em algumas regiões do País.

Todas essas determinantes estiveram na base da política dos Governadores, falsea- ram as eleições, interferiram no processo da organização municipal e projetaram refle- xos na máquina governamental.

No período de 1930 a 1934, com a ascen- são da classe média ao poder e com a dita- dura de Vargas e, mais, na ausência de Cons- tituição, o Brasil esteve sujeito às drásticas conseqüências do Decreto 19.398, de 11/11/ 1930: inexistência de Poder Legislativo; exer- cício de governo por interventores nomea- dos para os Estados, e por prefeitos, tam- bém, nomeados e sujeitos àqueles. Iniciou- se o período de centralização da Ditadura de Vargas, sob a bandeira de um projeto nacional urbano, de cunho industrialista. Nessa fase, teve, ainda, espaço o movimen- to constitucionalista.

Com a Constituição de 1934 (art. 13), sob o pálio das idéias sociais democráticas, re- gistrou-se o renascimento do municipalis- mo, ao amparo do Poder Central, com o res- tabelecimento e a ampliação da autonomia municipal, baseada no critério do peculiar interesse e assegurada em plano constitucio- nal: em termos políticos, pela eleição de pre- feito e vereadores; em matéria financeira, pela previsão de rendas próprias para o Município por meio de atribuição de com- petência tributária para decretação de seus impostos e, finalmente, pela capacidade or- ganizatória de seus serviços, severamente protegida contra a ingerência do Estado.

Lembra Melo13 que a ideologia munici- palista dessa época colocou-se contra as for- ças oligárquicas e corruptas, compromete- doras da racionalidade do aparelhamento estatal:

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“Na década de 30, Alberto Torres e Oliveira Viana enunciavam o muni- cipalismo como algo antagônico ao suposto estadualismo da República Velha que, dentro dessa crítica, era vista como inteiramente oligárquica e corrupta, onde as oligarquias estadu- ais e o mundo da política imprimiam irracionalidade à esfera pública”.

Segundo registro do mesmo autor14, a idéia entao defendida foi a de um Estado forte, no qual o Município pudesse signifi- car a esfera política comunitária. Nesse con- texto, o enaltecimento do municipalismo foi a estratégia de fortalecimento da União — contra a idéia da Província — tendo-se con- vertido, entao, nessa ideologia curiosa, ruralis- ta que aparece como redenção do interior, uma espécie de pedagogia rural.

No período de 1937 a 1945, atingido pe- los reflexos do impulso da industrialização, da crise de 1929, do Estado Novo, da defla- gração da Segunda Guerra Mundial, regis- trou-se um quadro desolador da história mu- nicipalista.

A Carta de 1937 manteve apenas nomi- nalmente o poder local. Vulnerou a autono- mia política: previu eleição de vereadores, mas, ao mesmo tempo, desprezou o Legisla- tivo, ao assinalar a dissolução dos sistemas de representação; definiu a nomeação pelo Governador como critério para investidura dos prefeitos e abrigou um regime interven- torial nos Estados e Municípios. Neutrali- zou a autonomia financeira e administrati- va no âmbito da Federação, mediante rigo- rosa técnica de concentração de poderes no âmbito do executivo federal em prejuízo de Estados e Municípios, transformados estes em instâncias gerenciais da União, tendo- se voltado a atenção desta, em especial, para as cidades estratégicas e de expressão in- dustrial.

No período de 1945 a 1964, o Brasil vi- venciou o cenário do fim da Guerra Mundi- al, da deposição do Governo Ditatorial, da queda do Estado Novo, da reconstituciona- lização do País, do liberalismo político, das

bandeiras do nacionalismo, da expansão da base econômica nacional, com substituição das importações. De traço democrático, o período restaurou o sistema federativo des- centralizador, oportunidade em que se res- tabeleceram os poderes das Casas Legisla- tivas e em que se abriram perspectivas de reorganização partidária.

A campanha municipalista teve grande reflexo na Constituinte de 1946 e impreg- nou a política do Estado Novo. Nesse con- texto, imbricada na cultura política não-li- beral, surgiu a proposta de uma República Municipalista, com base na redivisão dos Estados, como contraponto da hegemonia do café com leite15.

A Constituição de 1946, que reinaugu- rou os valores democráticos, deu nova den- sidade à autonomia, prefigurando-a segun- do as três linhas básicas: política; financei- ra e administrativa (art. 28). O arranjo cons- titucional prestigiou a instituição munici- pal, seja pela eqüitativa distribuição de ren- da mediante ampliação da participação do ente local nas finanças, seja pelo delinea- mento dos fundos de transferência, seja pela reintegração do Município no sistema elei- toral do País e, ainda, pelas categóricas bar- reiras à indiscriminada intervenção esta- dual nos municípios. Não se pode dizer, to- davia, de uma consistente autonomia polí- tica no referido período, sobretudo pela au- sência de clareza no sistema de repartição de competências e poderes entre as diver- sas esferas.

No período de 1964 a 1970, num cenário marcado pela queda de João Goulart; pelo golpe militar, com a ascensão das Forças Armadas, a distribuição do poder nas mãos de militares, tecnocratas e burguesia indus- trial; pela ditadura das armas, sob as ban- deiras da moralização, do desenvolvimen- tismo, do combate à inflação e da segurança nacional, a autonomia municipal apenas se manteve nominalmente. Esteve, aí, afetada pela hipertrofia do Poder Executivo, nota- damente na esfera da União, pelo dirigismo estatal, caracterizado por forte poder de in-

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tervenção do Governo Central em todos os domínios, por meio de planejamento fede- ral compreensivista dos diversos setores, pela expansão da máquina pública federal em modelo conformador do aparelhamento das esferas estadual e municipal, com pre- valência da simetria dos organogramas ra- cionalistas e burocráticos.

Com efeito, a Carta de 1967 e a Emenda Constitucional no 1/69 fragilizaram os Municípios em termos políticos, adminis- trativos e financeiros. Ficaram eles, finan- ceiramente, submetidos à União, que pas- sou a concentrar a maior parte da receita pública e a impor-lhes condição de mendi- cância e de dependência na aplicação das verbas; e tornaram-se os entes locais mais vulneráveis perante o Estado-membro, do ponto de vista político, pelo aumento das hipóteses de intervenção estadual; adminis- trativamente, estiveram condicionados à si- metria na organização, segundo matrizes da União, sem espaço para o necessário afina- mento às peculiaridades de cada qual. E é, ainda, nesse período que se estabeleceram rigorosas restrições à remuneração de verea- dores, determinando-se, para municípios com população abaixo de certa faixa, a gra- tuidade dos mandatos.

De 1970 a 1984, ainda sob a égide da Emenda Constitucional no 1/69, e presen- tes a ideologia e a estratégia da Revolução de 1964, os Municípios continuaram reféns da União, eis que permaneceram sujeitos à linha centralizadora do Governo Federal, no obstinado propósito de assimilar e impor os avanços da tecnologia. Tal linha, de ca- ráter racionalista, estratificou, sobremanei- ra, a dependência dos Municípios à tecno- cracia dos gabinetes.

Com efeito, na ditadura militar, a auto- nomia política foi atingida diretamente pela regra de nomeação de prefeitos de capitais, de estâncias e de municípios de Segurança Nacional; o campo de atuação legislativa foi, também, sensivelmente restringido, de modo que os governos locais atuaram como meros executores da política central, espe-

cialmente no tocante ao desenvolvimento urbano traçado pela União.

Registra-se a contribuição de Melo16 so- bre o municipalismo nas décadas de 60 a 80:

“Durante o regime militar, salvo num primeiro momento em que o Mi- nistério do Interior tinha a idéia de planos de desenvolvimento integrado, o municipalismo foi absorvido pelas políticas governamentais. Mas, com o segundo PNB e a recentralização que o governo Geisel imprime, o munici- palismo ficou deslocado, enquanto princípio ordenador de políticas. Isso se mantém até 1985, quando se ini- ciam os movimentos que vão transpa- recer na Constituição de 1988, que é profundamente Municipalista.”

No período de 1984 a 1988, abriram-se amplas perspectivas, a partir da mobiliza- ção da sociedade, de abertura política e dis- tensão.

Essas sinalizações intensificaram-se de- pois de 1984, com os movimentos popula- res pró-constituinte, as campanhas munici- palistas, a sensibilização da sociedade para participação das cruzadas pelos Planos de Estabilização do Cruzado, passando pelo Bresser e pelo Verão, e com o processo cons- tituinte, de caráter participativo e democrá- tico, que culminou com a edição da Consti- tuição de 1988, rotulada como Constituição da Cidadania, a qual, restabelecendo, por inteiro, a autonomia política, prescreve tra- tamento privilegiado à entidade local, inte- gra-a formalmente à Federação e agrega, ain- da, ao poder local a competência para ela- boração de sua lei orgânica, consolidando, de modo expressivo, o conteúdo de autono- mia municipal, sob o pilar do interesse lo- cal.

Vê-se, pois, que, ao longo da história bra- sileira, o conteúdo da autonomia munici- pal não se manteve uniforme, nem esteve infenso aos interesses da Coroa, às vicissi- tudes dos regimes, nem aos caprichos dos ditadores ou tecnocratas.

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Desde a sua inauguração nominal no texto constitucional de 1891, a autonomia foi mantida nas cartas seguintes, muitas ve- zes, relativizada: no plano político, pela no- meação de prefeitos, pelo fechamento das câmaras, pela neutralização do campo de competência legislativa municipal; no pla- no administrativo, pelas linhas centraliza- doras, pelos processos centrípetos de pla- nejamento e decisão no âmbito da União, pela prefiguração de modelos administrati- vos e de estrutura de serviços; no plano fi- nanceiro, por uma perversa repartição de receita que estruturou a onipotência da União. Esta, concentrando a receita públi- ca, pode manter reféns os Municípios, ten- do estes, por sua vez, na ode palaciana, o espaço de mendicância.

Nesse tópico, utilizaram-se amplamen- te dados constantes de estudos e quadros desenvolvidos por Brasileiro17 e Dias18.

4. Neo-municipalismo na constituição de 1988

Erigem-se como pilares estruturantes da Federação Brasileira, na Constituição de 1988, os comandos expressos nos artigos 1o e 18.

Na interpretação dos referidos disposi- tivos, especialmente no que tange à posição do Município no quadro federativo, diver- gem os doutrinadores, sustentando alguns a absoluta inconsistência da tese da figura- ção daquele como entidade federativa, e outros, a integração do ente local naquela estrutura. Na primeira corrente, colocam-se, entre outros, Baracho19 e Silva20. Aduzem, em abono à tese, argumentos como o de que o federalismo não pressupõe o Município como elemento essencial; o da não-partici- pação do ente local na formação da vontade e das decisões do Senado e na prestação ju- risdicional; o de que não se lhe reconhece o poder de apresentação de emendas à Cons- tituição. Sustentam, categoricamente, que a possibilidade de intervenção do Estado nos Municípios mostra a vinculação direta des-

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ses à entidade federativa intermediária ou regional, afastando, portanto, a vinculação dos entes locais à unidade federativa aglu- tinadora ou central, que é a União.

Em posição antagônica, colocam-se Bas- tos, Horta, Ferrari e Santana, entre outros.

Sustenta o primeiro21:

“Desde o momento em que a Cons-

tituição brasileira alçou o Município a entidade condômina do exercício das atribuições que, tomadas na sua unidade, constituem a soberania, não poderia, para ser conseqüente consi- go mesma, deixar de reconhecer que a própria Federação estava a sofrer um processo de diferenciação acentuada, relativamente ao modelo federal do- minante no mundo, que congrega ape- nas a ordem jurídica central e as or- dens jurídicas regionais: a União e os Estados Membros”.

Por sua vez, referindo-se ao esforço de reconstrução e retificação do federalismo como mérito inegável da Constituição de

1988,

Horta22 assinala:

“Projetou-se além da edificação re-

construída, para introduzir novos fundamentos e modernizar o federa- lismo constitucional brasileiro.

Entre esses fundamentos, sobres- sai a singular inclusão do Município entre os entes que compõem a união indissolúvel da República Federativa, no artigo inicial da Constituição (art. 1o). Essa eminência do Município não dispõe de correspondência nas ante- riores Constituições Federais Brasilei- ras, nem tão pouco nas Constituições Federais dos Estados Unidos, do Mé- xico, Argentina, Venezuela, Áustria, Alemanha, Canadá, Índia, Suíça e Austrália. A inovação da Constitui- ção adveio da atração sugestionado- ra do movimento municipalista, que rompeu o quadro da lógica constitu- cional e erigiu o Município autônomo em componente da República Federa- tiva”.

Revista de Informação Legislativa

Ferrari23, embora reconhecendo que o fe- deralismo se assenta sobre duas idéias fun- damentais – a autonomia das entidades fe- derativas e a participação dessas na forma- ção da vontade dos órgãos federais e nas suas decisões –, não nega a integração do Município no condomínio federativo:

“… na Federação brasileira, conforme determina a Constituição Federal, os Municípios são unidades territoriais, com autonomia política, administra- tiva e financeira, autonomia essa li- mitada pelos princípios contidos na própria Lei Magna do Estado Federal e naqueles das Constituições Esta- duais”.

Na mesma linha, e admitindo a relevân- cia dos argumentos contrários à tese da con- figuração do Município como entidade fe- derativa encontradiços na doutrina, adver- te Santana24:

“… o fato é que não podemos nos es- quecer de que os modelos federativos não podem ser transplantados de um Estado para outro. Enfatizamos nova- mente que cada Estado possui suas próprias características e, assim, tipi- ficam sua estrutura interna. No caso brasileiro é de se dar grande impor- tância a esse aspecto, porque, como sabido, todas essas particularidades que o Município apresenta são, em verdade, notas definidoras dos con- tornos da nossa fisionomia federati- va; são especificidades do ser-federa- tivo-pátrio”.

De fato, a Constituição de 1988 introduz significativas alterações na fisionomia do Estado Brasileiro. E, se já não tínhamos uma federação segundo o modelo tradicional, a partir da nova ordem, ela mais se afasta daqueles moldes, pela tonificação de suas peculiaridades. Acentua-se, portanto, a dis- tinção de tratamento dado ao ente local. Ganha este relevância no plano federativo, seja pela excepcionalidade do status a ele conferido, seja pela sinalização – pelo me- nos no plano constitucional – no sentido da

inversão do movimento expansionista do poder central.

Sobre a importância desse status do ente local, lembra Horta25:

“ a ascensão do Município desfaz antigas reservas que se opunham às relações diretas entre a União e o Mu- nicípio”.

Em efeito, a Carta é categórica ao explici- tar o Município na configuração da Federa- ção, é pródiga em referências ao ente local: uma leitura de seu texto evidencia a preocu- pação do constituinte em enaltecê-lo, quer no plano da estrutura do federalismo; quer na partilha de competências, embora seja possível verificar-se, ainda, a persistência de competências centralizadas em relação a uma gama considerável de matérias; ou, ainda, no reconhecimento de seu papel como importante agente de políticas públicas, e, especialmente, na dedicação de comandos básicos e preordenadores da lei orgânica municipal.

Sob a perspectiva reconstrutiva do federalismo, acena a Constituição para so- luções mediante cooperação entre a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Fe- deral, consoante disposto no artigo 23, pa- rágrafo único.

Além da reconstrução formal e material do federalismo de vocação cooperativa, com ênfase para o ente local, a concepção demo- crática de Estado é fator de fortalecimento da esfera municipal de governo.

De fato, a Constituição de 1988, acolhen- do as reivindicações dos movimentos orga- nizados, firma o compromisso com a igual- dade material, reconhece garantia de aces- so dos cidadãos aos serviços públicos so- ciais, consagra a universalização dos bene- fícios da seguridade social, entre outros, e traça diretriz de participação da sociedade na concepção, na execução e controle das políticas públicas, o que põe em realce, so- bretudo, o poder local26.

Como conseqüência do agravamento do quadro social e daquela mobilização, a má- quina pública é impactada pela demanda

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cada vez mais densa e diversificada de be- nefícios, o que reflete de forma mais clara nas esferas estadual e local, tendo em vista, principalmente, a diminuição da capacida- de de investimento do Governo Federal na prestação direta de serviços ou no financia- mento das políticas27.

A resposta natural seria a criação de me- canismos cooperativos consistentes entre as diversas esferas de governo e entre estas e o setor privado, como recurso indispensável para o enfrentamento das questões relacio- nadas com emprego, segurança, acesso a equipamentos básicos. O Poder Público de- veria conjugar seus esforços buscando si- nergia no âmbito da esfera pública estatal e, insuficientes tais esforços, pois o Estado não poderia dispor de todos os recursos e mo- dos de gestão para o atendimento das de- mandas sociais, invocar-se-ia, também, a integração da sociedade e do próprio setor de mercado.

O quadro de múltiplas demandas e o apelo de participação forçaram a precipita- ção dos processos de descentralização e cooperação, que têm conduzido, nos últimos anos, à formação de várias políticas seto- riais, sob novos moldes, alimentadas, tam- bém, por tendências internacionais: o SUS, que teve sua matriz na Reforma Sanitária Italiana de 1978; as políticas de controle social, que têm sua inspiração na França so- cialista28.

Esses processos de descentralização e cooperação desenvolveram-se, entao, sem os pressupostos das negociações políticas para que a incorporação de ações, serviços, equipamentos se fizesse sem os traumas que se impuseram como resultado da lógica au- toritária no traspasse dos serviços sociais. As bases de cooperação federativa revelam- se insuficientes no plano constitucional e sequer estavam disciplinadas pela via legal ou mediante pactos sociais. E, ainda, o ve- tor da participação popular se conduzia mais em caráter emblemático que conse- qüente, não figurando como instrumento efetivo de controle. Entre esses fatores, a

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ausência da lei complementar preconizada pelo art. 23 da Constituição da República ressai como dificultador da desejável inte- ração ou inviabiliza, na prática, o federalis- mo cooperativo29.

Nesse sentido, a crítica de Ferreira30, Co- ordenador do Grupo de Trabalho sobre Des- centralização e Federalismo do IPEA:

“Apesar do avanço no reconheci- mento da autonomia dos entes fe- derativos, o Texto Constitucional é, porém, falho no que diz respeito a uma definição clara de competências den- tro da Federação. (…) Mas a indefini- ção de perfil da estrutura cooperativa dentro da Federação e a imprecisão das fronteiras de competência faz com que a União dificulte esse processo de descentralização, interferindo na au- tonomia dos outros níveis de poder”.

O certo é que, nesse contexto, o munici- palismo passa a ser defendido sob enfoques diferentes e sobre bases ideológicas distin- tas: como princípio democrático e como prin- cípio de engenharia administrativa, com vistas à construção da eficiência na prestação do setor público. Essas idéias, segundo Melo31, constituem o núcleo de sustentação do con- senso em torno da idéia do neo-municipalismo.

O autor32 sustenta, contudo, ser mera- mente aparente essa unidade em torno do municipalismo, colocando sob foco o apa- rente consenso relativo à autonomia do ente local, que, na sua advertência, escamoteia um dissenso muito profundo. Para ele, o neo-muni- cipalismo brasileiro ou o neo-localismo, como discurso recorrente, há de ser apreendido segundo as conotações que lhe emprestam os núcleos filosóficos subjacentes, os quais, por sua vez, se inscrevem em genealogias in- telectuais distintas:

“Na realidade, a idéia de descen- tralização é hoje lugar comum tanto em uma agenda neo-liberal quanto em uma agenda histórica, identificada com a social-democracia, uma agen- da reformista e, ambas aquelas são simétricas dentro de uma tradição neo- liberal.

Revista de Informação Legislativa

A idéia da descentralização, da de- volução de funções e competências a entes subnacionais, equivale a uma estratégia maior de retirada de parce- la do poder do Governo central. Este é o Leitmotiv da idéia da descentraliza- ção. Da mesma forma, dentro de uma agenda social democrática, histórica, a idéia de descentralização é inteira- mente diversa; aqueles que propug- nam pela descentralização e pela au- tonomia local, em última instância, estão postulando a democratização da gestão e a ampliação do controle social”.

Na perspectiva da teoria econômica, o contraponto é o mercado como mecanismo locativo; sob a ótica da democratização da gestão, a participação do cidadão tem o pri- mado”33.

Assim, na prática de descentralização de políticas públicas, não se tem verificado a sintonia entre os entes federativos, o que acarreta irracionalidade de gastos públicos e prejuízo de qualidade da prestação. De igual modo, as parcerias público e privado, por ausência de tradição na realidade, fra- gilizam-se, na prática, em razão do com- prometimento do interesse público e da pre- valência da lógica de socialização de ônus e privatização dos benefícios. E, por fim, a participação popular, apesar dos avanços já conquistados, ainda não alcançou o está- gio de efetivo controle social. Demais disso, a nova ideologia municipalista há de se as- sentar, sim, sobre os pilares da participa- ção, da democratização da gestão, da efi- ciência do setor público na prestação de ser- viços públicos, da parceria, mas isso não basta, eis que não pode perder de vista os fatores que desafiam a criatividade e o arro- jo das cidades, as quais se colocam como referência de identidade e estratégia de su- peração da crise contemporânea.

Nesse sentido, deve-se acreditar como Magalhães34 que, à luz dos paradigmas do Estado Democrático de Direito, na perspec- tiva da construção do Estado Constitucio-

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nal, novo tratamento há de ser dado ao po- der local, projetando-lhe força proativa da mudança do próprio Estado na relação com a sociedade.

4.1. Competências constitucionais do Município

Tradicionalmente, o conceito de autono- mia do Município fixou-se sobre os pilares do provimento privativo dos cargos gover- namentais e da competência exclusiva do ente local no trato de assuntos afetos do seu peculiar interesse.

Na Constituição de 1988, o arranjo da autonomia municipal está estruturado pe- los artigos 1o,18, 29, 30, 35, 39, 145, 149, 150, 158, e 182, entre outros. O conteúdo do po- der aí delineado expressa-se em quatro pla- nos: o da auto-organização, o do autogover- no, o da autolegislação e o da auto-admins- tração, sendo o primeiro a principal novi- dade incluída no objeto do “direito público subjetivo” do Município, oponível aos de- mais entes federativos, consoante anotação de Meirelles35.

O teor político da autonomia revela a ca- pacidade de o Município estruturar seus po- deres, organizar e constituir seu próprio governo mediante eleições diretas de prefei- tos, vice-prefeitos e vereadores e de editar o seu próprio direito, observados os princí- pios estabelecidos na Carta da República e na Constituição do Estado. Nesse plano, ga- nha relevância a análise da competência le- gislativa do ente local.

Os artigos 21, 22, 23 e 24 da Constitui- ção da República atribuem competências aos diversos entes federativos.

A norma prevista no art. 21, relativa à União, enunciada por verbos que remetem a ações concretas, sugere um plano de atua- ção administrativa, ou seja, indica compe- tência executiva. Contudo, essa prevalência de seu caráter não exclui competência legis- lativa em matérias referidas naquele espaço de atribuição. E, conquanto aquela atuação não esteja restringida privativamente à União, não parece comportar partilhamen-

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to com as demais esferas, salvo no que toca à elaboração e execução de planos de orde- nação do território e de desenvolvimento econômico, social e urbano, incluindo habi- tação, saneamento básico e transportes, pela pertinência do interesse e tendo em vista o apelo de complementariedade que a com- petência atribuída à União suscita.

A competência estabelecida no art. 22 di- rige-se à União em caráter privativo e tem natureza legislativa. Só comporta partilha com outras esferas quando têm sede na União as diretrizes ou normas gerais ou, ainda, quando a matéria, mesmo tematiza- da no art. 22, tenha um desdobramento es- pecífico a justificar a tutela direta do inte- resse local. Quanto ao Estado, é de desta- car-se o disposto no parágrafo único do ar- tigo referido, que deixa à lei complementar a possibilidade de autorização para que aquele legisle sobre questões específicas re- lacionadas no artigo.

No art. 23, a Constituição da República trata da competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municí- pios. Esse traço da competência é definido por Silva36 como a faculdade de legislar ou pra- ticar certos atos, em determinada esfera, junta- mente e em pé de igualdade, consistindo, pois, num campo de atuação comum às várias entida- dês sem que o exercício de uma venha a excluir a competência de outra.

Assim, não obstante catalogue o artigo uma série de ações comuns aos diversos entes, do que se deduz, à primeira leitura, um traço executivo de competência, tem-se que a legislação instrumental de ações enunciadas fica, também, alçada às entida- dês indicadas no caput.

No art. 24, tratou o constituinte de disci- plinar a competência no âmbito da legisla- ção concorrente. Não incluiu nesse condo- mínio o Município. Contudo, a referida au- sência não significa, segundo sustentam alguns autores, que o Município não tenha competência nesse campo concorrencial, pois restar-lhe-ia a competência para legis- lar sobre matéria de interesse local, com ful-

cro no art. 30, I, bem assim para suplemen- tar a legislação federal e a estadual, no que couber, a teor do art. 30, II, podendo incidir sobre matérias constantes do artigo 24.

Nessa ordem de idéias, Santana37, trace- jando um elástico contorno do poder de atua- ção legislativa do Município, afirma a exis- tência de competência concorrente originá- ria do ente local.

Adverte o magistrado38, no entanto, para o fato de que os Municípios não estão habi- litados a editar normas concernentes ao art. 24, simultânea ou concomitantemente com a União ou Estado, restringindo-se ao âm- bito da expressão no que couber.

E assenta o mesmo autor39:

“Evidente não se tratar apenas de

competência administrativa regula- mentar. Os Municípios estão autori- zados, por força de dispositivo cons- titucional, a legislar suplementarmen- te. Podem, em nosso entender, ditar leis que tenham por objetivo o estabe- lecimento de regras específicas e, quando for o caso, também estão legi- timados à elaboração de leis gerais quando tal se faça necessário em ra- zão do exercício de competências ma- teriais, comuns ou privativas”.

De outro lado, os que inadmitem atua- ção do Município no âmbito da legislação concorrente, isto é, competência suplemen- tar por força do art. 24, destacam que o dis- posto no art. 30, II, há de ser entendido como poder de mera complementação, ou seja, de adaptação às peculiaridades comunais.

Contudo, tem-se reconhecido ao Muni- cípio operar no campo legislativo relativa- mente a matérias elencadas no art. 24, por força de conjugação com outras normas atri- butivas de competência ao Município ou ao poder público genericamente.

Nesse sentido, por exemplo, o julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais na Apelação Cível no 72.988/9 – Co- marca de Belo Horizonte. Rel. Des. Campos Oliveira, cuja ementa encontra-se assim re- gistrada: “Tombamento de Imóvel – Com-

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petência Legislativa do Município. Inteli- gência dos Arts. 24, VII; 30, II, e 216, § 1o da Constituição Federal. Mandado de Seguran- ça – Fundamentação da Sentença (“MG” 5/ 4/1997).

A capacidade auto-organizatória é um desdobramento da autonomia política, que ganha contorno no poder de edição pelo Mu- nicípio de sua própria lei orgânica.

Horta40, referindo-se a esse aspecto da autonomia municipal, leciona:

“Prestigiando a descentralilzação normativa, consectário da descentra- lização política, a Constituição de 1988 implantou o poder de auto-or- ganização do Município, atribuindo- lhe a elaboração da lei orgânica.

A decisão do Constituinte federal retoma no plano mais elevado da Constituição da República a solução originariamente contemplada na Constituição do Rio Grande do Sul, de 14 de julho de 1981 (art. 64)”.

A Constituição, inovando nesse ponto, apresenta uma matriz da lei orgânica mu- nicipal, isto é, traz normas de preordenação balizadoras do tratamento de determinados temas na esfera local. O processo de elabo- ração daquela lei tem, por sua vez, caráter especial, consoante definido na própria Carta da República, em linha bastante rígi- da, à semelhança do processo constituinte.

O art. 29 da Carta da República localiza o Estado Brasileiro no sistema de Cartas Pró- prias relativamente à organização munici- pal, projetando a lei orgânica com status de lei fundamental.

O plano administrativo da autonomia diz respeito ao espaço de ação do Municí- pio voltada para a organização e prestação de serviços de sua competência. Esse com- ponente do poder autônomo do Município tem seu fundamento, especialmente, no dis- posto no art. 30, V, cuja redação é a seguin- te:

“Art. 30 – Compete ao Município: (…)

V – organizar e prestar, diretamen-

te ou sob regime de concessão ou per- missão, os serviços públicos de inte- resse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;”

Analisando o art. 30, comando de cen- tralidade inegável para o Município, afir- ma Santana41:

“Sendo a base das competências legislativas municipais aquela forma- da pelo teor do art. 30 da Carta Fe- deral, cumpre-nos esclarecer que o constituinte acabou por fazer opção em não apartar em dispositivos dis- tintos as competências materiais das competências legislativas.

(…)

Convivem, assim, no mesmo dis- positivo as competências municipais de ordem legislativa e de ordem mate- rial. Isto porque o constituinte, tam- bém para as competências materiais, erigiu o critério do interesse local como o ponto de partida para a sua concre- tização”.

Com efeito, essa competência adminis- trativa desenha-se em função do interesse local, o que justifica atenção especial na análise da expressão, cuja adequada inter- pretação poderá inibir a invasão de compe- tência, pelo Município, de outra esfera de governo42.

Da lição de Bastos43, colhem-se alguns elementos conformadores do interesse local: “Cairá, pois, na competência mu- nicipal tudo aquilo que for de seu in- teresse local. É evidente que não se tra- ta de um interesse exclusivo, visto que qualquer matéria que afete uma dada comuna findará de qualquer manei- ra, mais ou menos direta, por repercu- tir nos interesses da comunidade na- cional. Interesse exclusivamente mu- nicipal é inconcebível, inclusive por razões de ordem lógica: sendo o Mu- nicípio parte de uma coletividade maior, o benefício trazido a uma parte do todo acresce a este próprio todo. Os interesses locais dos Municípios

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são os que entendem imediatamente com as suas necessidades imediatas, e, indiretamente, em maior ou menor repercussão, com as necessidades ge- rais.”

A conotação da expressão, portanto, não remete à exclusividade – sob pena de, no sistema federativo, comprometer-se a uni- dade, que pressupõe superposição de inte- resses com a impossibilidade de absoluto isolamento de seus diversos níveis –, mas ao critério da prevalência.

Relativamente ao poder administrativo do Município, a derradeiro, enfatiza-se cons- tituir o art. 23 em conjugação com o art. 30, V, VI, VII, VIII, IX, a sede especial de sua previsão.

O elemento da autonomia no campo fi- nanceiro está previsto no art. 30, III, cuja re- dação prescreve competir àquele ente: insti- tuir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar ba- lancetes nos prazos fixados em lei.

Esse poder no plano financeiro deve ser exercido nos termos dos artigos 145; 149, parágrafo único; 156 e 158 da CF.

5. Descentralização e poder local sob uma visão comparativa

A leitura comparativa de diversos qua- dros de poder local em países desenvolvi- dos leva à conclusão de que o Brasil detém posição privilegiada quanto à descentrali- zação, o que não afasta a necessidade de que a referida técnica, entre nós, persiga a vertente da democratização da gestão ou, por outras palavras, a incorporação do po- der local que se localiza fora dos centros ofi- ciais dos Poderes Executivo e Legislativo. Com efeito, poucos países apresentam ex- periências em que o Município participe do condomínio de poder de forma tão expres- siva, pelo menos em plano nominal. Para exemplificação desse contraste entre o Mu- nicípio brasileiro e outras experiências de poder local, comenta-se a descentralização no Estado alemão, no qual a instância co- munal, reconhecidamente um destaque em

termos de eficiência na prestação de servi- ços públicos, ostenta uma autonomia sensi- velmente menos expressiva que a do Muni- cípio brasileiro, que traz matrizes muito pe- culiares. São registradas, também, informa- ções básicas relativas a outras organizações de governos locais de destaque no plano da prestação de serviços públicos.

5.1. Descentralização na Alemanha

A descentralização é um fenômeno in- ternacional, ganhando matizes próprios em cada realidade que lhe serve de suporte de aplicação. O modelo alemão de descentrali- zação, pelas suas peculiaridades, é aqui des- tacado a partir de considerações desenvol- vidas no Seminário Internacional Princípio da subsidiariedade e o fortalecimento do Poder Local no Brasil e na Alemanha44, realizado em São Paulo, em 1994.

No referido evento, Lässing45, Prefeito da Microrregião de Rems-Murr-Kreis e Presi- dente da Associação Brasil-Alemanha do Distrito de Baden-Württemberg, realça os traços da Federação alemã, em considera- ções que são amplamente usadas no pre- sente tópico.

Aquela federação compõe-se de 16 Esta- dos Federados (11 da Velha República Fe- deral da Alemanha e os novos que ressurgi- ram a partir de 1990) e da União Federal, detendo cada qual a qualidade de Estado. A organização comporta ainda as entida- dês locais, os Municípios ou autarquias municipais, cerca de 10.000, aproximada- mente, e os Landkreis, circunscrições ou re- giões, que atuam como instâncias de gover- no de nível intermediário de Municípios e Estados.

O princípio do Estado Federativo é into- cável na Constituição alemã, enquadrando- se numa longa tradição constitucional, só interrompida com o Estado unitário dos Na- zistas, de 1933 a 1945, de modo que a Ale- manha faz parte dos clássicos países fe- deralistas46.

Os encargos da legislação dividem-se entre a União e os Estados Federados, con-

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tando também os Landkreis com sua própria câmara, a Kreistag, com Constituição Regio- nal própria.

Na autonomia legislativa do Estado Federado, inclui-se a competência relati- va à edição da Constituição Municipal, documento que traça modelos próprios de estruturação do poder local, apresenta ar- ranjo específico e peculiar aplicável aos mu- nicípios integrantes do território estadual, aos quais é reservado o direito de regula- mentar, sob responsabilidade própria, todas as questões de interesse da comunidade lo- cal, isto é, todas as funções públicas nos res- pectivos territórios47.

As competências administrativas distri- buem-se entre as diversas instâncias. Estão sob responsabilidade direta da União, en- tre outras, a política externa, a defesa, a or- ganização e manutenção do serviço militar, a definição da política econômica e monetá- ria, podendo o Estado participar da Admi- nistração da União. Uma administração própria da União só existe, basicamente, em estreito campo de atuação, cabendo aos Es- tados autonomia no tocante a uma gama de atividades administrativas. A eles cabem o ensino público, a política de cultura e a res- ponsabilidade pelo corpo policial, entre outras competências48. Já os Municípios, consoante disciplinam as leis comunais, são responsáveis primariamente pelas questões de interesse local, prevalecendo, assim, em relação a eles a norma da universalidade, que pode ser restringida pela legislação, já que esta pode ser instrumento de transfe- rência dessas questões para instâncias in- termediárias ou para a estadual ou federal.

A relativização da universalidade, que se dá pela lei, não pode perder de vista o princípio da subsidiariedade, aplicável ao sistema alemão, e que se assenta na racio- nalidade das soluções da instância local pela sua proximidade com os problemas e demandas mais imediatas e concretas. Por força do referido princípio, só o que não pode ser adequadamente atendido pelos Municí-

pios é transferido para outra esfera de go- verno.49

Nesse diapasão, cabe à União a defini- ção quanto aos conteúdos mais abstratos e ideológicos; aos Municípios, de uma forma geral, ficam reservadas as funções traduzi- das por prestações obrigatórias como as de registro, de proteção por corpo de bombei- ros, de instalação de cemitérios, de criação de câmaras de desenvolvimento, de manu- tenção de escolas para todos os níveis de formação, de construção de rodovias, de abastecimento de água, e por encargos vo- luntários relacionados com o oferecimento de infra-estrutura adequada para a prática de esportes, o acesso à educação, à cultura, ao lazer, entre outras prestações. Além de cumprir essas funções básicas que afetam a vida da comunidade, o Município vem atu- ando, também, como elemento de peso na economia, dirigindo empresas de eletricida- de, gás, e transportes; aos LandKreis cabe a solução de problemas que ultrapassem a capaci- dade administrativa ou financeira dos Municí- pios, como construção de grandes hospitais, co- leta de lixo, escolas profissionalizantes, escolas especiais, rede rodoviária, assistência social, transporte público, entre outros. E não desem- penham eles apenas funções das autarqui- as municipais, mas também do Estado, su- jeitando-se à fiscalização deste no que se refere à execução das leis vigentes50.

Na esfera de sua autonomia, estão os Municípios protegidos contra o próprio Es- tado de que fazem parte, que a eles deve res- peito, sem prejuízo do poder de lhes impor sujeição à sua fiscalização jurídica e aos in- teresses mais abrangentes e gerais51.

A publicação Perfil da Alemanha registra fragmentos históricos da autonomia muni- cipal naquele país:

“A autonomia administrativa mu- nicipal, como expressão da liberdade cívica, tem tradição na Alemanha. Remonta aos privilégios das cidades livres da Idade Média (…)”, entanto, em tempos recentes, relacionada com o surgimento do Código das Cidades, adotado na Prussia em 1808. A lei fun- damental “garante a autonomia ad- ministrativa das cidades, comunida- dês municipais e distritos, dando-lhes o direito de regulamentar a critério próprio todos os assuntos da comu- nidade local, dentro da moldura tra- çada pelas leis. O Direito comunal é da competência dos Estados: as Cons- tituições Municipais diferem muito de Estado a Estado; isso também tem ra- zões históricas”52.

Lässing53, relatando a experiência mu- nicipal alemã, destaca a importância histó- rica desse nível de governo:

“Depois da destruição da II Guer- ra Mundial, foram os Municípios que primeiro alcançaram condições de funcionamento, pois na miséria e no caos do pós-guerra, foram eles os pri- meiros a retomar suas atividades, pois seu funcionamento era necessário para solucionar os problemas ime- diatos”.

Na mesma linha, Jung54, Diretor da Fun- dação Konrad Adenauer – Stiftung no Bra- sil, assimilando a tendência mundial de fortalecimento do Município no Estado De- mocrático, mostra o conteúdo da autonomia no Direito alemão:

“Na Alemanha, existe a medida necessária de autonomia para que cada Município possa germinar, de per si e sobre sua própria responsabi- lidade, todas as questões que dizem respeito à comunidade local. Nessa concepção, a auto-administração mu- nicipal deve ficar livre, na medida possível, da tutela do Estado. Por isso, os cidadãos são instados a participar ativamente da solução dos assuntos locais. Desta forma, a auto-adminis- tração municipal funciona como es- pécie de escola de democracia”.

Estudiosos como Scheid55 chamam a atenção para o grau de solidez de implanta- ção de regulamentos territoriais democráti- cos e descentralizados na Alemanha, reco-

nhecendo nos Länder os verdadeiros prota- gonistas da política de organização territo- rial. Nesse nível subnacional, a República Federal Alemã ostenta estrutura adminis- trativa de planejamento extremamente de- senvolvida e abrangente, cujo princípio é o do “contrafluxo” que materializa uma es- treita combinação do planejamento dos Län- der e de suas entidades subregionais, e que projeta o Município como instância de exe- cução de várias políticas contempladas no amplo planejamento.

Finalmente, com relação às bases de fi- nanciamento das políticas públicas, cabe ressaltar que as Regiões dispõem de rendas próprias oriundas da cota arrecadada pe- los municípios, do recolhimento de impos- tos a elas destinados, de taxas e tarifas rela- tivas aos setores sob sua responsabilidade. Recebem, também, subvenção da União e do Estado para execução de leis ou para inves- timentos específicos. Os Municípios, igual- mente, dispõem de receitas próprias e bene- ficiam-se de transferências e subsídios dos Estados e da União para compensação por execução de leis ou para subsidiar certos encargos56.

Observa-se que o Município alemão, con- quanto assentado em concepção diversa de autonomia e cuja delimitação decorre do próprio Estado-Membro, na prática, coloca- se como autêntica instância de democracia, e de cumprimento efetivo do papel estatal.

5.2. Outras experiências de governos locais

A descentralização do Estado como es- tratégia de democratização é uma tendên- cia generalizada, sobretudo na Europa.

O artigo intitulado “La Democracia Ter- ritorial. Descentralización Del Estado Y Po- líticas en la Ciudad”, de Borja i Sebastiá57, analisa o crescente processo de descentrali- zação do Estado na Europa, mostrando a tentativa de se dotarem as instituições ad- ministrativas de maior identidade comuni- tária. O trabalho indica os Municípios como Revista de Informação Legislativa sujeitos comunitários privilegiados no refe- rido processo de descentralização, aborda- do como elemento chave para moderniza- ção das administrações públicas e como condição prévia e favorável à participação cidadã. Por outro lado, cuida de questões polêmicas derivadas da experiência euro- péia de descentralização, notadamente das situações em que se verifica a hipertrofia das instituições representativas locais sem os correlatos fins de democratização da gestão e atuação mais global. Por fim, o artigo mos- tra que o urbanismo que se afigura, acatan- do a diretriz participativa, abandona o rígi- do funcionalismo do passado em favor de uma concepção mais compreensiva e poli- valente da cidade, postulando mecanismos de inclusão da cidadania para materializa- ção da democracia política, econômica, so- cial e cultural. Nesse sentido, deve ser en- tendida a revalorização das cidades, bair- ros e comunidades enquanto espaços privi- legiados de enraizamento da estrutura po- lítico-administrativa e de gestão política contemporânea na Europa.

Um estudo comparado dos modelos de organização de governos locais adotados por diversos países que se destacam na pres- tação de serviços mostra que o grau de auto- nomia do governo local não guarda relação direta com o nível de eficiência dos serviços no plano municipal, isto é, a forma de Esta- do ou o tipo de organização não interfere diretamente nesses resultados. A relação mais direta se estabelece em função dos pa- drões de gestão e do grau de identificação do cidadão com a esfera comunitária. Re- gistramos alguns fragmentos de estudos nesse sentido e que sintetizam as principais características das administrações selecio- nadas neste tópico.

Relativamente aos Estados Unidos, Es- tado Federal por excelência, Meirelles58, en- fatizando a eficácia do Município a despei- to da falta de arrojo de sua burocracia, apon- ta a multiplicidade de modelos de estrutu- ração do poder local:

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“Quanto à forma de administração municipal, não é menor a diversida- de de sistemas adotados nos vários Estados e até mesmo entre cidades de um mesmo Estado, podendo-se distin- guir os seguintes tipos básicos: 1) o governo por um Conselho (council) que toma decisões colegiadas; 2) o gover- no por uma Comissão (comission), em que cada membro cuida individual- mente de uma atividade pública; 3) o governo por um indivíduo (Mayor), em cujas mãos se concentram amplos poderes, embora assessorado por um Conselho; 4) o sistema denominado federal analogy, bastante próximo do regime municipal brasileiro; 5) o go- verno por um gerente (Manager), con- tratado para administrar a cidade por um determinado período”.

Entre esses sistemas, o mais comum é o Governo pelo Mayor, no qual a figura cen- tral é a do prefeito eleito, por voto direto e não obrigatório, pela respectiva comunida- de, e o Conselho corresponde a uma Câma- ra Municipal; no sistema de Governo por Council, o prefeito é eleito pelo mesmo pro- cesso, mas detém poderes muito mais restri- tos, já que as decisões são tomadas pela Câmara; o sistema de Governo por Gerente concentra o poder político na Câmara, re- servando a gestão administrativa para o manager, uma espécie de profissional con- tratado pela Câmara. Este, detendo conhe- cimentos específicos de Administração Pú- blica, de Finanças, entre outros, reúne con- dições satisfatórias para a indicação de so- luções para o Município, as quais se sub- metem à apreciação pelo Conselho. Contu- do, a regra é a eficiência do serviço munici- pal americano, independentemente do sis- tema que o sustenta, sendo certo que o cida- dão exerce um papel ativo na cobrança de qualidade59.

Acrescente-se que, nos Estados Uni- dos, paralelamente à burocracia tradicio- nal, atuam as agências da Administração Pública Americana, às quais são delegados poderes para a realização de funções de interesse governamental. São formalmen- te dependentes do legislativo e do executi- vo, sujeitam-se ao controle político de suas decisões, o que é de expressivo relevo para sua eficácia60.

Itália

Meirelles61 analisa a autonomia do Mu- nicípio italiano, indicando múltiplas inter- ferências sobre o campo de atuação do po- der local, seja por meio de mecanismos de intervenção da Província em casos excep- cionais, seja pela presença de delegados do mesmo poder provincial em atividades per- manentes de controle, ou ainda pela no- meação de certos agentes pelo Ministério da Justiça.

França

Quanto à França, Meirelles62, realçando o traço administrativo de sua descentrali- zação, localiza em três níveis as atribuições daquela natureza: o do Estado, o dos De- partamentos e o da Comuna, reconhecida esta como uma coletividade territorial e es- fera administrativa preponderante para o cidadão. Mostra, contudo, que a autonomia da Comuna francesa é sensivelmente mais acanhada que a que se atribui ao Município brasileiro, comparecendo ela, naquele Esta- do unitário, na base hierárquica, sucessiva- mente controlada pelo departamento e pelo Estado.

A despeito da acanhada autonomia, o modelo de gestão e prestação de serviços pú- blicos na França estrutura-se com grande apoio nas Comunas. Lorrain63, analisando esse modelo, realça a especificidade da or- ganização dos serviços urbanos, apontan- do três importantes fatores que os informam. Em primeiro lugar, uma arquitetura admi- nistrativa e um sistema de ofertas que divi- de tarefas entre agentes públicos e privados, nacionais ou locais, tendo como base terri- torial as Comunas. Em segundo lugar, o modelo de serviços urbanos caracteriza-se pela busca de formas cooperativas entre

agentes envolvidos, preservando-se-lhes autonomia financeira, e flexibilidade insti- tucional. Por último, salienta a cultura polí- tica que subjaz à concepção e regulação dos serviços urbanos, qual seja, o critério de boa execução dos serviços a partir da opinião dos administrados.

6. Conclusão – uma visão crítica da autonomia no Brasil

1) O Município brasileiro, de inspiração portuguesa, foi introduzido na Colônia, ten- do como modelo institucional de gestão o Concelho lusitano, transplantado da expe- riência urbana de Portugal para a nova so- ciedade política, assentada, especialmente, sobre bases rurais.

2) O processo histórico de estruturação da municipalidade, entre nós, baseado em artificiosos e contraditórios interesses de emancipação comunitária, imprimiu no Fe- deralismo brasileiro feição própria, caracte- rizada, inicialmente, pela garantia de auto- nomia à esfera local e, a partir da Reforma Constitucional de 1926, pela incorporação expressa do Município, condição que per- sistiu em constituições posteriores até con- solidar-se na Constituição de 1988 como entidade federativa.

3) Integrando o condomínio do poder no Estado Federal, colocou-se, desde logo, como partícipe das competências constitucionais expressivas da autonomia em diversos des- dobramentos.

4) A despeito do teor autonômico origi- nário do próprio texto da Constituição Fe- deral, e por força de seus próprios ditames, submetia-se a entidade local, até 1988, com raras exceções, à capacidade organizatória dos Estados-Membros, da qual deveria pro- jetar-se a matriz estrutural dos Municípios; o regime municipal como um todo, por sua vez, sofria os reflexos dos nefastos proces- sos de concentração de poderes na União, seja no plano financeiro, seja no plano polí- tico-administrativo, pelos reiterados mecanismos de inibição do papel governativo e administrativo do Município.

5) A descentralização político-adminis- trativa, conquanto seja uma tendência con- temporânea, entre nós, está longe de alcan- çar o estágio desejável, quer pela ambigüi- dade no plano de definição de competên- cias, quer pela imposição de matrizes da União que minimizam a força criadora dos Municípios no sentido de soluções próprias, ou pela persistência de práticas autoritárias, que condicionam a atuação da instância local à capacidade reativa desta em face da quebra dos lindes de sua autonomia pelo Poder Central, seja, ainda, pela dificuldade de adaptação da realidade comunitária à normatividade nacional e vice-versa.

6) Sob a perspectiva de consolidação da descentralização, a par da superação das dificuldades apontadas, tornam-se necessá- rias a ampliação das bases da negociação política dos processos de dispersão do po- der e de cooperação, a conformação da dis- ciplina legal dos mecanismos da prática fe- deralista cooperativa, o investimento na ca- pacidade institucional dos atores respon- sáveis pela sua operacionalização e a ousa- dia de construção de soluções próprias.

7) Numa sociedade em transição, que abriga situações distintas e contraditórias, em termos de densidade populacional, ex- tensão territorial, arrecadação, renda per cap- ta, características do povo e do eleitorado — sob o signo da mais ampla diversidade cul- tural —, o modelo de autonomia não pode- ria ser o mesmo para todas as municipali- dades e nem poderia ser o Município a úni- ca unidade de Governo local. Experiências alienígenas mostram uma proliferação de formas organizativas do poder local em con- traste absoluto com a simetria de organiza- ção política brasileira, na qual sujeitam-se as pequenas comunidades e os grandes cen- tros urbanos, entre os quais figuram mega- cidades do mundo, a idênticas prescrições de autonomia.

8) Não se percebe relação direta entre forma de Estado e autonomia de base comu-

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nitária ou grau de eficiência da instância local na prestação de serviços públicos. Há, igualmente, Estados unitários e federais com elevados padrões de desempenho do setor público local e com ampla integração da co- munidade nas instâncias decisórias, assim como há exemplos extremados de ineficiên- cia e autoritarismo nos mesmos modelos. O importante é a prática do regime autonômi- co no plano de realidade em modelos me- nos artificiosos e mais plausíveis e adapta- dos às peculiariedades.

9) Há necessidade de ampla reflexão so- bre a prática descentralizante, com vistas, especialmente, à identificação do núcleo ide- ológico que a sustenta, distinguindo as es- tratégias de sua aplicação, consoante aler- tam os estudiosos da matéria. Como princí- pio democrático, a prática tende a integrar a base comunitária nos processos de decisão e a estimular o controle social da atuação da esfera local; como princípio de engenha- ria administrativa, a descentralização pode sustentar soluções de eficiência pela lógica da proximidade em relação a problemas e alternativas para seu enfrentamento, ou se estabelecer como mecanismo de afastamen- to do Estado de áreas tradicionalmente a ele reservadas, o que se vislumbra num hori- zonte de artificiosa substituição dos entes central e intermediário pelo de âmbito local e, finalmente, pelo mercado, em hipótese de ineficiência do Município.

10) Pretende-se como núcleo ideológico prevalecente na descentralização o de ins- piração democrática, o que invoca a inter- pretação da autonomia segundo paradig- mas que apelam pela inserção do poder co- munitário na esfera decisória de âmbito lo- cal, que se há de expandir como espaço de experiência direta da cidadania. Nesse sen- tido, o fortalecimento do Município deve, ne- cessariamente, passar pela sua consolida- ção como espaço privilegiado de manifesta- ção dos discensos e tensões e, por conse- qüência, de consensos sociais.

À evolução do regime municipal na cons- trução normativa e nas concepções doutri-

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nárias nem sempre corresponde o aperfei- çoamento da autonomia no plano de reali- dade, isto é, a definição dos contornos da autonomia no sistema jurídico e a internali- zação e sofisticação teórica de seus elemen- tos, pressupostos e desdobramentos não são instrumentos suficientes de contenção do movimento expansionista do poder central; essas balizas podem estar mais ou menos flexibilizadas pela força interpretativa dos tribunais e pelas precompreensões e precon- ceitos que se revelam, também, no campo da regulação e da prática da autonomia muni- cipal, tendo em vista as interfaces com os demais entes federativos.

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Notas

1 Sobre o processo de formação dos municípios brasileiros, veja-se CARNEIRO, Levi. “Organiza- ção dos Municípios e do Distrito Federal”. Rio de Janeiro: S/ Ed., 1953, p. 9–14.

2 CASTRO, José Nilo de. “Direito Municipal Positivo”. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 31.

3 GODOY, Mayr. A Câmara Municipal. 2 ed. São Paulo: EUD, 1989, p. 10. APUD CASTRO, José Nilo, IBIDEM.

4 ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. O Municí- pio no Sistema Constitucional Brasileiro. Belo Hori- zonte: UFMG, 1982, p. 21.

5 CASTRO. Ibidem. p. 30.

6 ROCHA. Ibidem. p. 22–3.

7 WILHEIN, Jorge. e LEVY, Maria Bárbara.

Apud. DIAS, José Maria A. M. Fundamentos Insti- tucionais do Município Brasileiro. Belo Horizonte: Ed. do autor, 1994, p. 2–4; CASTRO, José Nilo de. Ob. Cit. p. 30–1.

8 ROCHA. Ibidem. 20–7.

9 BRASILEIRO, Ana Maria. O Município como Sistema Político. Rio de Janeiro: FGV, 1973, p. 4.

10 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: RT, 1985, p. 39.

11 BASTOS, Aurelino Cândido Tavares. A Pro- víncia. São Paulo: Ed. Nacional; Brasília: INL, 1975. 12 MELO, Marcus André B.C. de. O Município na Federação Brasileira e a Questão da Autonomia in Subsidiariedade e Fortalecimento do Poder Lo- cal. Debates. Fundação Konrad Adenauer Stiftung – Representação no Brasil. São Paulo: Centro de

Estudos, 1995, n. 6. p. 64. 13 MELO. Ibidem.

14 MELO. Ibidem.

15 MELO. Ibidem.

16 MELO. Ibidem. p. 65.

17 BRASILEIRO, Ana Maria. Capítulo Evolu- ção do Governo Local no Brasil – Quadro “O Siste-

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ma maior e a Autonomia Municipal” in O Municí- pio como sistema Político. RJ: FGV (Cadernos de Administração Pública – Administração Municipal), 1973, p. 3–12.

18 DIAS, José Maria de Almeida Martins. Anexo – Quadro Evolutivo da Autonomia Municipal – Contexto Sócio-Político e Econômico Brasileiro in Fundamentos Institucionais do Município Brasilei- ro. Belo Horizonte: Edição do autor, 1994.

19 BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria Geral do Federalismo, Belo Horizonte: FUMARC – UCMG.

20 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo: RT, 1990, p. 408 –9.

21 BASTOS, Celso. Comentários à Constituição do Brasil, São Paulo: Saraiva, 1988, v. I, p. 232.

22 HORTA, Raul Machado. Estudos de Direito Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey. 1995, p. 523.

23 FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Ele- mentos de Direito Municipal, São Paulo: RT, 1993, pp. 62 e 63.

24 SANTANA, Jair Eduardo. Competências Le- gislativas Municipais. Belo Horizonte: Del Rey, 1993, p. 40.

25 op. cit. p. 523.

26 FERREIRA, Paulo Brum. O Modelo Federati- vo Brasileiro: Evolução, o Marco da Constituição de 1988 e Perspectivas in Subsidiariedade e Forta- lecimento do Poder Local. Debates. p. 9.

27 FERREIRA. Ibidem.

28 MELO. Ibidem. p. 66.

29 FERREIRA, op. cit. p. 10.

30 FERREIRA: Ibidem.

31 MELO, op. cit. p. 65.

32 MELO. Ibidem. p. 63.

33 MELO. Ibidem.

34 MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. “Po-

der Municipal: paradigmas para o Estado Consti- tucional”. Belo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, 1997.

35 Apud FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Elementos de Direito Municipal. SP: RT. 1993, p. 65.

36 SILVA. op. cit. p. 415.

37 “Afirmamos haver no âmbito municipal as competências ditas concorrentes, mesmo a despeito de não constar o Município no rol do artigo 24 da Constituição Federal, porque o próprio artigo 30, inciso II, dá a exata magnitude desse campo a ser explorado pelo referido ente. De fato, ́cabe ao município, suplementar a legislação federal e a es- tadual, no que couber’

(…)

Releve-se, mais uma vez, que o simples fato de ter sido o Município excluído do artigo 24 não é fator conclusivo de que não tenha ele competência concorrente. Desmente quem assim o afirma o pró- prio teor do artigo 30, II, da Constituição Federal. Colocado nosso entendimento com relação ao

tema e, concluindo que se trata de modalidade de competência legislativa concorrente primária (por- quanto prevista diretamente da Constituição Fe- deral), não podemos comungar, por incompatível, com o pensamento que professa Manoel Gonçalves Ferreira Filho ao afirmar que o artigo citado apenas autoriza o Município a regulamentar normas fe- derais ou estaduais” (SANTANA. op. cit. p. 89).

38 “Pensamos que, na verdade, a competência concorrente primária (na sua acepção mais rigoro- sa) somente foi partilhada entre a União, os Esta- dos e o Distrito Federal, nos moldes do artigo cita- do. De modo que, em tais termos o Município não a tem. (…)

Portanto, a legislação municipal somente po- derá se efetivar após detectados os requisitos exigi- dos pela expressão “no que couber”, ou seja, para que seja viável a legislação municipal é de se ver que a normação existente é deficiente ou insuficien- te de modo a comportar normação local, aliando- se a isso as demais exigências constitucionais, con- forme teremos oportunidade de ver. Inobstante, utilizaremos a expressão concorrente para desig- nar a competência legislativa municipal que ad- vém do inciso II do artigo 30 (Carta Federal), já que ela se encontra de certo modo consagrada em nosso meio” (SANTANA. Ibidem. p. 89).

39 SANTANA. Ibidem. p. 90.

40 HORTA, Raul Machado. Estudos de Direito Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, p. 524.

41 ob. cit. p. 87–8.

42 SANTANA. ob. cit. p. 97.

43 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito

Constitucional, 1989, p. 277.

44 Evento promovido pela Representação da

Fundação Konrad Adenauer – Stiftung no Brasil em conjunto com o Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal – CEPAM, da Funda- ção Prefeito Faria Lima, no auditório da CEPAM – Cidade Universitária, São Paulo, nos dias 17 e 18 de outubro de 1994, com participação de autorida- dês e estudiosos brasileiros, cujos debates estão registrados em publicação da referida fundação, sob aquele título e datada de 1995.

45 LÄSSING, Horst. O Papel da Esfera Munici- pal no Modelo Federativo Alemão in Subsidiarie- dade e Fortalecimento do Poder Local. Debates. p. 49.

46 Perfil da Alemanha. Societáts – Verlag. Frank- furt Germany. 1992. Tradução: João A. Persh e outros.

47 Ibidem.

48 LÄSSING. op. cit. p. 49–50. 49 LÄSSING. Ibidem. p. 49.

50 LÄSSING. Ibidem. p. 52–3.

51 LÄSSING. Ibidem. p. 50.

52 p. 135–6.

53 op. cit. p. 50.

54 JUNG, Winfried. Palavras de abertura do Se-

minário Internacional “Princípio da Subsidiarieda- de e o Fortalecimento do Poder Local no Brasil e na Alemanha”. in Subsidiariedade e Fortalecimento do Poder Local. Debates. p. 3.

55 SCHEID, Andreas Hildenbrand. Politica de Ordenación Del Territorio en Alemania. Las experi- encias de Los Länder e su interés para las Comuni- dades Autónomas. In: Ciudad y Territorio Estu- dios Territoriales, III (104). Madrid, MOPT, 1995, p. 297–313.

56 LÄSSING. op. cit. p. 52.

57 BORJA i SEBASTIÁ. La Democracia Territo- rial. Descentralización del Estado y Politicas en la Ciudad. In: Ciudad y Territorio–81–82 13–41, Ma- drid, MOPT, 1989 – p. 25–38.

58 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 45.

59 Informações extraídas de entrevista feita por Paulo David de Oliveira Ferreira – UFMG com os advogados Roy Alexander e J. Meurling, o primeiro da Imigration and Naturalization Service e o se- gundo da Shell Oil Company, ambas dos Estados Unidos.

60 Ibidem.

61 “O Município italiano (Comune) é autônomo no âmbito dos princípios fixados pelas leis da Re- pública, dispondo do poder de editar normas lo- cais e de arrecadar tributos necessários a suas des- pesas. É, entretanto, criado e organizado pelo Esta- do em moldes uniformes para toda a República (CF, art. 118)”.

O governo local é constituído pelo prefeito (Sin- daco), pela Junta Municipal (Giuta Municipale) e pelo Conselho Comunal (Consiglio Comunale), na confor- midade do Dec. Legislativo 1, de 7–1–46.

O prefeito é o presidente da Junta e o represen- tante legal da Comuna, enfeixando em suas mãos todas as funções executivas da administração lo- cal.

A Junta Municipal é o órgão administrativo au- xiliar do prefeito, constituída por secretários eleitos entre os conselheiros, e variando o seu número de 2 a 14 membros, conforme a população da Comuna. A Junta, além de auxiliar o prefeito na rotina admi- nistrativa, colabora com o Conselho na tarefa legis- lativa e pode substituí-lo na função deliberativa dos casos de urgência, submetendo a sua resolu- ção, posteriormente, à ratificação da Câmara Co- munal. Em caso de impedimento ou irregularidade verificada na Junta, a Província, por seu governa- dor (Prefetto), pode intervir na Comuna por meio de interventor provincial (Comissario Prefettizio), até a regularização do governo municipal.

164

Revista de Informação Legislativa

A Comuna italiana possui, ainda, um órgão sui generis, que é o Escritório Comunal (Ufficio Comu- nale), dirigido por um secretário remunerado pela administração local, mas equiparado em suas prer- rogativas a funcionário provincial, e com a incum- bência de fiscalizar a execução das leis e atos dos administradores locais. O secretário comunal é no- meado e transferido pelo Ministério do Interior, ouvida a Comuna interessada (Dec. Legislativo 553, de 21–8–45, e Lei 530, de 9–6–47). Sua posição é a de delegado do poder provincial no Município.

O órgão legislativo da Comuna italiana é o Conselho Comunal, composto de membros eleitos por sufrágio direto, em número variável de 15 a 80, segundo a população local” (ob. cit. p. 55).

62 “… as Comunas e os Departamentos que as agrupam são as únicas unidades territoriais com alguma importância político-administrativa na di- visão do território francês. Todavia, comparadas com os Municípios e os Estados-membros brasilei-

ros, essas unidades territoriais desfrutam de uma autonomia muito acanhada, em razão do enérgico controle do Estado, que atua até mesmo com po- deres hierárquicos. Esse controle é exercido não só sobre os órgãos unipessoais, como, também, sobre as assembléias locais (Conselhos departamentais e comunais). Com efeito, no plano municipal, o Con- selho pode ser dissolvido por decreto motivado do presidente da República, que também pode exone- rar qualquer de seus membros; o Maire e seus ad- juntos podem ser suspensos por um mês pelo Pré- fet (agente executivo do Departamento) e por três meses pelo Ministro do Interior, e revoqués, isto é, destituídos de suas funções executivas, sem prejuí- zo de sua condição de conselheiros municipais, por decreto do presidente da República, em qualquer caso, sempre motivadamente” (Ibidem. p. 53).

63 LORRAIN, Dominique. El Modelo France de Servicios Urbanos. In: Ciudad Y Territorio 15, n. 2, Madrid, MOPT, 1991, p. 15–27.

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